domingo, 5 de julho de 2009

Alta Fidelidade.

(...) Assisti ao filme "Alta Fidelidade" pela milésima vez. Mas como toda boa obra, nunca é esgotável a interpretação, mesmo que se decore o roteiro, os diálogos.
Bem, o filme está classificado como comédia. Mas é um dos filmes que mais falam de amor, relacionamentos reais e de fidelidade.
Rob e Laura formam um casal com problemas como todos os outros. Mas por incrível que pareça a traição não os torna desleais e infiéis um ao outro. Você pode não entender do que estou falando, a gente nunca quer e não é fácil perdoar uma traição. Mas falo de algo muito mais importante.
Acho que a fidelidade está em primeiro lugar. E fidelidade mesmo é coisa rara! Laura e Rob se permitem à liberdade de tentar, arriscar outros caminhos, quando se sentem pouco doadores de seus afetos um para com o outro (isso é fidelidade!). E é justamente no caminho árduo de uma separação que se descobrem de uma fidelidade realmente sincera, e é aí que mora o amor. Não aquela idéia falsa de que viver bem, preso, calado, sem brigas e sem contradições, seja demonstração de fidelidade.
Um relacionamento "tranquilo", onde o outro sempre cede, onde tudo combina, onde é tudo claridade, é um fato reconhecimento egoísta o "Eu amo você". Isso é previsível, é fácil demais amar assim (...)
Amar o oposto de você, com sua liberdade, vontades, sonhos, gostos, opiniões, religiões, credos e tudo o mais que nos torna únicos, é o que chamo de troca de amor real. Não aquela imagem da novela "Caminho das Índias" onde fidelidade seja a submissão e obediência eterna ao chamado "marido", que aliás tem obrigatoriamente ser chamado de "marido" e nunca pelo nome de registro por banais convenções que, ao meu ponto de vista, nada tem a ver com amor e respeito.
Outro dia, brincando com o Moca (aqueles momentos de falar bobagens e rir juntos das idiotices do outro), ele me disse o que ninguém nunca conseguiu demonstrar com tanta sinceridade. Eu o perguntei,
"Amor como você sabe que me ama? O que te leva a sentir isso por mim?"
Ele me envolveu em seus braços e disse docemente:
"Eu sei disso quando você faz tudo errado..."

Poucas pessoas que eu compartilhei esse momento demonstraram compreender que eu falava de amor sincero. Porque de fato, eu nunca me senti tão amada.

(...)

Alta fidelidade é descobrir nos desprazeres de um relacionamento a disposição de compartilhar alguma coisa sincera se arriscando ser você mesmo, admitir amar no outro mesmo aquela infeliz joanete nos pés e ainda fazer de tudo isso uma listinha “top five” de coisas que tornam o outro singular, a ponto de conseguir com que ele se sinta único no mundo, apesar de todas as imperfeições.

(...)

Aqui vai meu “top five” preferido do filme, quando Rob vê em Laura “fidelidades” grandiosas que ela representa em sua vida:

“As cinco coisas que mais sinto falta na Laura:

Um: Senso de humor. Seco, mas também meigo e bondoso. E o riso dela é o melhor de todos os tempos. Ela ri com todo o corpo.

Dois: Ela tem personalidade. Ou tinha antes desse pesadelo com Ian. Ela é leal e honesta... e não desconta seus dias ruins em ninguém. Isso é personalidade.

Três: Sinto falta do seu cheiro e do seu gosto. É um mistério da química humana, não entendo. Mas algumas pessoas, quanto aos sentidos... parecem ser sua casa.

Quatro: Curto o jeito como ela anda. Como se não ligasse para sua aparência ou como se projeta. E não é que não ligue, é que não se deixa afetar. É o que lhe dá graciosidade.

Cinco: Faz uma coisa na cama quando não consegue dormir. Ela geme e esfrega os pés o mesmo número de vezes. É demais.

Poderia relacionar cinco coisas que me irritam. Mas vem com a variedade feminina, coisas estranhas...e foi pensando nisso que cheguei até aqui.”

(...)

Quantas vezes você declara “Amo você” sem fidelidade nenhuma?

Lembre-se, “alta fidelidade” é uma reflexão diária sobre as “anormalidades” do outro que se tornam primordiais para o reconhecimento de um amor sincero e insubstituível.